Na sequência da ação judicial interposta pela Junta de Freguesia de Covas do Barroso contra o Projeto da Mina do Barroso, em concreto no que diz respeito à Declaração de Impacte Ambiental (DIA), o Ministério Público já se pronunciou e entende que a DIA Favorável Condicionada, atribuída à Savannah Resources, “é ilegal e padece de invalidades várias”, acolhendo os argumentos e factos pelos quais os seus Advogados têm lutado.
No processo em causa, o Ministério Público invoca diversas irregularidades de que o ato administrativo corporizado na DIA padece, e que devem conduzem à anulabilidade do mesmo. Um dos principais aspetos realçados prende-se com o facto da ampliação da atividade mineira na região colocar em risco o Sistema Agro-Silvo-Pastoril do Barroso, descaracterizando-o e consequentemente, levando à desclassificação do mesmo como SIPAM (Sistema Importante do Património Agrícola Mundial), o que viola os compromissos internacionais que o Estado Português assumiu com a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), de proteger, apoiar e aumentar a qualidade de vida na região do Barroso. Na mesma linha de pensamento, viola também a Política Agrícola Comum (PAC) da União Europeia e o Plano Estratégico da PAC 2023-2027 (PEPAC) para Portugal, e colide com os objetivos dos financiamentos comunitários do programa SIPAM e investimentos de apoios financeiros do Baldio do Barroso.
Segundo o Ministério Público, a DIA Favorável Condicionada viola também o art. 17º n.º 1 do DL nº 30/2021, de 7 de maio, na versão da Lei nº 10/2022, de 12 de janeiro, tendo em conta que este não permite a revelação e o aproveitamento de recursos minerais em território SIPAM, o que foi considerado em Avaliações Ambientais Estratégicas (AAE) precedentes, mas não foi levado em conta pela DIA em questão.
Considerando que, ao apresentar o projeto como uma alteração (ampliação) ao projeto já existente na mina do barroso, a concessionária desvirtua a avaliação de impactes negativos, o Ministério Público sustenta que se trata de “um conjunto de novos subprojectos, que não foram analisados pela DIA, e cujo efeito, intensidade e complexidade vão muito para além da área a ampliar, sendo essa a área de afetação ambiental imediata”.
É ainda reforçado que a DIA não só não faz uma correta avaliação da gestão de resíduos de extração mineira como viola o regime aplicável, indicando que não é possível viabilizar ambientalmente o enchimento de cortas com resíduos da extração mineira, posto que os resíduos de extração merecem a classificação de resíduos perigosos, devendo ser-lhes aplicado o Regime das Emissões Industriais destinado às instalações de resíduos perigosos. O documento do Ministério Público enfatiza ainda que “não consta do procedimento AIA o impacte ambiental da demolição das novas barragens que se pretende construir, o impacte ambiental de contaminação do meio hídrico (Rio Covas e águas subterrâneas), devido ao enchimento de vazios e escombreiras não impermeabilizadas com resíduos de extração que são perigosos, o risco de acidentes e catástrofes que assiste aquelas estruturas, bem como não releva o impacte ambiental da construção de uma nova estrada de acesso externo à mina. Vem igualmente refletir que a DIA não pondera o real impacto do projeto cumulativamente com o da Mina do Romano, no Município de Montalegre, dada a proximidade e dimensão dos dois projetos.
Outro dos aspetos realçados pelo Ministério Público prende-se com o facto de se admitir que a China possa ser o destino do minério, o que não resolve a problemática da dependência externa do fornecimento de lítio da União Europeia, acrescentando que “metade do minério em causa é meramente estimado, espelhando uma incerteza quanto ao real aproveitamento, o que não foi tido em conta pela DIA”.
Em termos da fauna, o documento exarado pelo Ministério Público a probabilidade de extinção da espécie lobo ibérico, considerada em perigo e em estado de conservação desfavorável na zona onde o projeto se insere, reforçando que as medidas de minimização compensatórias previstas “são vácuas e carecem de demonstração de efetividade”, complementando que a DIA omite também fundamentação quanto ao fator alterações climáticas, aspeto de valoração essencial.
Por fim, o Ministério Público invoca a violação do Anexo V e do art.º 29º do DL nº 151-B/2013, de 31 de outubro, porquanto faltam elementos que permitam ao público interessado, titular do direito de participação na consulta pública, compreender o projeto e expressar as suas opiniões e preocupações.
Estas são as principais circunstâncias realçadas pelo Ministério Público, e que afastam a viabilização ambiental do projeto. Face ao exposto e em geral, o Ministério Público vem aderir à posição manifestada pela Junta de Freguesia de Covas do Barroso no referido processo judicial, reforçando a luta que a população de Covas do Barroso tem encetado, contra aquele que é o maior projeto de exploração de lítio da Europa Ocidental.
O Presidente da Câmara Municipal de Boticas, Fernando Queiroga, congratula-se com a posição do Ministério Público, sublinhando que “demonstra que os argumentos da população do Concelho de Boticas e em particular de Covas do Barroso contra o projeto da Mina do Barroso são totalmente legítimos”, reforçando que “o Ministério Público vem dar ainda mais força à luta que tem sido encetada contra a exploração de Lítio”, até porque, no âmbito das suas competências, o Ministério Público sustentou as ilicitudes do projeto da Mina e formulou uma posição clara no processo, sustentada por milhares de documentos”.